A filha do teatro

de

Luís Augusto Reis

A Filha do Teatro 2009

A relação de família que se estabelece entre três mulheres e o assassinato de uma diretora de peças experimentais é o ponto de partida de A filha do teatro. O espetáculo é uma homenagem ao teatro e uma busca pelo seu sentido.

A peça de Luís Augusto Reis, que recebeu pelo texto da peça o Prêmio Funarte de Dramaturgia em 2003, é estruturada em nove monólogos e a história contada a partir de três pontos de vista diferentes: o da vítima, mãe adotiva de uma menina; o de uma ex-atriz pornô, mãe biológica da garota; e o da própria filha.

As atrizes que representam esses personagens, não contracenam, elas se revezam na interpretação das personagens, revelando, a partir de perspectivas diversas, os fatos que antecedem o assassinato. Mas elas estão em cena o tempo todo. Aquelas que não estão falando, permanecem à vista do espectador operando a luz, o som, abrindo ou fechando uma cortina, fazendo com que a cena se desenvolva.

Entretanto, tão importante quanto o conteúdo da história, é a necessidade de ela se mostrar enquanto tal, como pura narrativa. Na literatura contemporânea, segundo o ensaísta francês Maurice Blanchot, a narrativa não deve ser compreendida como o relato de um acontecimento, ela própria é um acontecimento. A filha do teatro dialoga com essa idéia. E a cena apresenta uma série de engrenagens a serem montadas pelo espectador, sem que a história seja deixada de lado.

A filha do teatro estreou em 2008 no Espaço Sesc. Convidada para participar do Festival Janeiro de Grandes Espetáculos, no Recife, o espetáculo fez 3 apresentações na capital pernambucana em janeiro de 2009 e, em abril, realizou mais uma temporada no Rio numa galeria de arte da Caixa Cultural.

Ficha Técnica

direção ANTONIO GUEDES
dramaturgia FÁTIMA SAADI
cenografia DORIS ROLLEMBERG
vídeo PAULA BAHIANA
figurino MAURO LEITE
iluminação BINHO SCHAEFER
música original PAULA LEAL
fotografia e design gráfico LUIZ HENRIQUE SÁ
produção executiva DAMIANA GUIMARÃES e LILIANA MONT SERRAT
diretora assistente DANI LOSSANT
fonoaudióloga FLÁVIA CARVALHO

 

Elenco

PRISCILA AMORIM
FERNANDA MAIA
VIVIANA ROCHA

  • A filha do teatro, de Luís Augusto Reis, 2008. Foto: Luiz Henrique Sá.
  • Viviana Rocha. A filha do teatro, de Luís Augusto Reis, 2008. Foto: Luiz Henrique Sá.
  • Priscila Amorim. A filha do teatro, de Luís Augusto Reis, 2008. Foto: Luiz Henrique Sá.
  • Fernanda Maia. A filha do teatro, de Luís Augusto Reis, 2008. Foto: Luiz Henrique Sá.
  • Fernanda Maia. A filha do teatro, de Luís Augusto Reis, 2008. Foto: Luiz Henrique Sá.
  • Fernanda Maia. A filha do teatro, de Luís Augusto Reis, 2008. Foto: Luiz Henrique Sá.
  • Viviana Rocha e Fernanda Maia. A filha do teatro, de Luís Augusto Reis, 2008. Foto: Luiz Henrique Sá.
  • Fernanda Maia (vídeo). A filha do teatro, de Luís Augusto Reis, 2008. Foto: Luiz Henrique Sá.
  • Priscila Amorim. A filha do teatro, de Luís Augusto Reis, 2008. Foto: Luiz Henrique Sá.
  • Priscila Amorim. A filha do teatro, de Luís Augusto Reis, 2008. Foto: Luiz Henrique Sá.
  • A filha do teatro, de Luís Augusto Reis, 2008. Foto: Luiz Henrique Sá.
  • A filha do teatro, de Luís Augusto Reis, 2008. Foto: Luiz Henrique Sá.

Crítica

  • JORNAL DO COMMERCIO – Artes e Espetáculos
    Ida Vicenzia – 01/05/2009

     

    Em cartaz na Caixa Cultural da Av. Almirante Barroso, A filha do teatro, texto de Luís Augusto Reis, direção de Antonio Guedes. O texto, Prêmio Dramaturgia da Funarte de 2003, nos remete à vida real sem ser um texto realista. Ou melhor, o recurso narrativo buscado pelo autor poderia cair na armadilha do realismo, nas mãos de um diretor menos criativo. No caso, parodiando Pirandello, trata-se de um texto à procura de um encenador. Guedes mostra ser o artista indicado, pois, ao narrar o drama de uma vida, acrescenta, à narrativa, uma ação teatral deflagrada por imagens que capturam o público.

     

    O que mais impressiona no espetáculo é o texto possuir características de depoimento, com uma estrutura fechada, e, ainda assim, dar espaço para a modernidade. Uma leitura “cibernética” na qual câmaras, telões e aparelhos eletrônicos transmitem a ilusão de multiplicação da ação. Detalhe que intriga: as raízes clássicas do teatro estão presentes, com o surgimento de cada personagem como um corifeu narrando o acontecido.

    Pensando bem, trata-se de uma reciclagem de linguagens antigas, acrescidas de novas técnicas. Esse encontro de gêneros (o moderno e o clássico) surge principalmente em consequência da encenação das atrizes que, “impregnadas” pelo texto (belo trabalho), tornam-se, ao mesmo tempo, personagens e coro da tragédia narrada.Fernanda Maia, Priscila Amorim eViviane Rocha alternam-se, tornando vivo o relato dos acontecimentos.

    O espectador é pego de surpresa pela crueza da palavra falada, à qual vem juntar-se a técnica de uma câmara que a tudo amplia. Esse alternar do foco dramático vem reforçar outro aspecto do espetáculo: o “tempo”, como representação. Há um encadeamento de cenas que se inicia com um som minimalista que se repete: um tiro, um choro de criança e acordes de uma música pontuam o início de cada ação. As falas se organizam a partir desses sons. É como se estivéssemos vivendo em um eterno presente.

    Objetivo, o texto procura entender a motivação dos personagens. No caso, o problema recorrente da relação da mãe biológica (a prostituta) com a “filha do teatro”, a menina que nasceu e se criou na ribalta. Há também o relacionamento dessa menina com suas “outras mães”. Para contar essa história fracionada percebemos uma aproximação do diretor com o teatro experimental. Talvez este seja o estágio atual do Teatro do Pequeno Gesto, criado por Antonio Guedes e Fátima Saadi– uma aproximação com o teatro de pesquisa, com o teatro contemporâneo. Até um passado recente, a preocupação do grupo era a encenação dos grandes clássicos, deles fazendo parte, por exemplo, Quando nós os mortos despertarmos, a despedida simbolista de Ibsen.

     

    O tema da presente encenação é palpitante. O que presenciamos na Galeria 2 da CaixaCultural é uma experiência artística marcante: imaginemos um palco, uma divisão, e duas cenas com depoimentos simultâneos. Há a sugestão de vozes, de ecos, de vida compartilhada, estilhaçada. Estamos participando de uma experiência que confunde o espaço cênico.

    A vida real encenada no texto permite que a ação se subverta. O caminho tomado pela narrativa é a palavra sendo vulnerada pela exacerbação: sexual, emocional, antiética, do sexo como condenação. Esse esfacelamento de todo pudor abre espaço para uma narração em que a verdade domina. A vida real pulsa, tal como é imaginada pelas atrizes-personagens. Luís Augusto Reis, o autor, inverte a vida real em seu texto e o resultado não pode ser mais eficaz. Várias são as opções de vida vivida, porém a prostituta (a transgressora) eletriza a cena.

    A personagem central, “a filha do teatro”, analisa e procura compreender as três mulheres que a encaminharam na vida. Por concessão do autor, ela transforma-se em uma atriz, herdando talvez o talento da mãe biológica (marcante a cena da interpretação de Lorca feita pela prostituta). A procura da “filha”, para compreender o conflito em que vive, se encaixa na narrativa em um movimento constante. A cenografia, impactante, é responsável pela mobilidade do espetáculo. Uma criação de Doris Rollemberg. Fátima Saadi, a “dramaturg”, destaca a eficácia do texto. A iluminação de Binho Schaffer é um fator que acrescenta ritmo ao espetáculo, com suas luzes acompanhando a ação. Os vídeos são de Paula Bahiana. A corda esticada da narrativa se encarrega do resultado. É bom ver bom teatro.

  • Três mulheres por trás de um crime
    Macksen Luiz – Jornal do Brasil – 06/12/2008

     

    O texto do pernambucano Luís Augusto Reis, em cartaz na Sala Multiuso do Sesc, divide a narrativa de um crime e a prática do teatro por três personagens, que, em vozes diretas, montam a história. Não é propriamente um formato original, muito menos inovador, mas artifício bastante atraente de explorar e desconstruir a maneira como se propõe a estabelecer o fluxo da palavra. Aproveita-se da linguagem cênica para verificar os seus meios. Ha­bilidoso como estrutura e seguro em seu desenvolvimento, permite que esses planos se encontrem de modo sintético e ajustado, formando um corpo dramático atraente. A ausência de rebuscamento confere simplici­dade formal, que pode sugerir ao encenador sugestivas alternativas de traduzi-lo no palco.

    Antonio Guedes aproveitou bem as indicações do autor para ampliar o sentido teatral da nar­rativa, sob a perspectiva de incluir até mesmo a plateia como recurso de encenação. A cenografia de Doris Rollemberg é decisiva nessa concepção, dividindo em duas a área de representação, separadas por cortinado transparente. As atrizes circulam, ora por um, ora por outro espaço, dirigindo-se frontalmente ao público, quando não indiretamente, através de imagens projetadas. O diretor conduz com fluência o tabuleiro com três figuras que se movimentam para ordenar uma forma de contar e de assistir. As atrizes – Fernanda Maia, Pris­cila Amorim e Viviana Rocha – têm atuações contidas pela maneira como buscam a atenção da plateia. Diretas, sem dramaticidade, são peças de um quebra-cabeças, percorrendo uma história e mostrando como pode ser decomposta em sua unidade.


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